No dia 1 de fevereiro haverá eleição na Câmara de deputados e no senado. Os candidatos favoritos para os parlamentares, os atuais presidentes das casas, representam o controle do poder legislativo.
Se os deputados e senadores elegerem esses mesmos presidentes mais uma vez isso significa uma coisa muito perigosa para o que restou das ruinas do nosso estado de direito: o risco de dar ao poder executivo a capacidade de mudar a constituição.
Lembrando que a mudança da constituição é EXCLUSIVA dos legisladores. O poder executivo pode propor mas não pode aprovar ou vetar. O Congresso é quem aprova e tem de seguir todo o trâmite como se tivesse sido apresentada por um deputado ou senador.
Mas então como isso pode ser dado ao executivo? Atropelando o processo legislativo. Explico.
Para se fazer uma mudança constitucional o projeto precisa de no mínimo 171 assinaturas de deputados; depois é apresentado a mesa da câmara e enviado para uma comissão; depois disso algum deputado precisa se interessar em fazer a relatoria, negociar com a comissão para pautar e votar seu parecer; depois é reenviado para a mesa da câmara; lá precisa mais uma vez negociar com o presidente da câmara para instalar uma comissão especial para debater mais uma vez o tema; e com isso vem um novo relator; depois do debate na comissão especial o grupo de deputados tem um período para propor emendas; finalmente o novo relator apresenta um relatório final que vai a voto na comissão; somente depois de cumprir positivamente essa etapa a emenda constitucional pode ser levada ao voto no plenário.
Com a PEC dos Gastos não foi assim. Iniciaram as primeiras etapas no Senado onde os apoiadores do “novo governo” tem maioria e logo depois de aprovado em plenário do Senado o projeto foi enviado para a câmara. Lá o projeto foi apensado (“colado”) a um outro projeto que já estava na etapa final do processo descrito acima. Isso permitiu que o projeto sem nenhum debate na câmara fosse levado diretamente ao voto em plenário da Câmara.
Apresentei um requerimento de “desapensamento”, para que a PEC dos Gastos tivesse a chance de percorrer as comissões e as analises de impactos. Mas foi negado sob o pretexto que os projetos eram “semelhantes” e poderiam ser apensados. Óbvio que não eram. O projeto que foi usado como hospedeiro sequer suscitava debate sobre o risco de causar inflação descontrolada.
Em outras palavras, encontrou-se uma maneira de driblar todo o regimento legislativo para que a agenda do executivo prevalecesse. Isso é novidade? Não. Em diversas ocasiões nos governos passados a mesma coisa aconteceu.
Esse tipo de atropelo é praxe quando o poder executivo tem pressa e está disposto a “pagar” para furar a fila dos freios e contra pesos que foram criados para preservar a integridade do debate. Esse é apenas um aspecto menos conhecido da velha politica do “jeitinho”.
Como se não bastasse o atropelo, ambos os presidentes da câmara e senado trabalharam ativamente, sem nenhuma isenção, na busca de votos favoráveis a PEC do Rombo usando todo poder de toma-lá-dá-cá que lhes é conferido com o comando da máquina legislativa.
E quais novas mudanças constitucionais o executivo quer?
Só nesse primeiro ano algumas delas já foram ventiladas na mídia como a criação de uma Força Nacional, reforma tributária, moeda única, controle do banco central etc… Para citar apenas algumas de cabeça.
E como os presidentes de câmara e senado se comportarão, caso reeleitos, uma vez apresentados essas novas propostas?
Será que irão percorrer o processo justo e aceito do regimento, feito para permitir ajuste ou mesmo a rejeição do projeto ou será que promoverão o atropelo como o da PEC dos Gastos?
A história do sucesso dos países desenvolvidos, com estados de direito avançados, é a historia do fortalecimento de seus Congressos e Parlamentos. Detalhes como esses apresentados são os que definem se temos de fato um estado de direito ocidental ou se na verdade vivemos em uma “ditadura democrática” como na China.