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Por que nossos deputados federais são ineficientes?

Escrito por

Luiz Philippe de Orleans e Bragança

Quase tudo que você pode fazer, ou não, está previsto na Constituição Federal do Brasil. Esse conjunto de leis, reformado pela última vez em 1988, rege a vida dos brasileiros em conjunto com códigos, como o penal, civil, tributário e derivados.  Todas essas normas são escritas ou apreciadas pelos deputados federais e senadores, que qualquer que seja a origem de uma lei, são responsáveis por sua revisão e aprovação.

Sabe aquela sensação de só com o “jeitinho” a coisa vai? Ela é consequência direta de leis falhas, abusivas ou incompletas. E tudo isso é causado por um sistema igualmente falho, abusivo e mal construído.

Pode parecer absurdo, mas poucos brasileiros têm noção do que um deputado federal faz, ou da importância que aquele voto depositado tem para o futuro do nosso país. Para entender a situação atual do Brasil basta olhar para nossa câmara de deputados federais, quem faz parte dele e o que ele produz.

Já que não sabemos o que eles fazem, criou-se o mito de que há deputados demais.  O Brasil tem 513 deputados federais representando uma população de 220 milhões. Esse número já foi menor em termos absolutos mas muito maior em termos relativos.

Durante o Brasil Império, por exemplo, havia a metade de deputados mas a população não ultrapassava os 10 milhões de habitantes.  A Inglaterra nos dias de hoje tem 650 deputados, relativamente o mesmo número há 200 anos, e o país tem 66 milhões de habitantes.  A França tem 577 deputados para um país de 67 milhões de habitantes e o Macron acha muito.

O sistema representativo da Inglaterra e da França não são tão ineficazes como o do Brasil.  O Brasil concentra poder em poucos representantes, tem custo insustentável, suas decisões são inócuas e eles, como representantes, não representam nada e ninguém.  Conseqüentemente não são cobrados pela população.  Exatamente o oposto desses modelos desenvolvidos. O que importa não é o numero e sim sua eficácia.  Isso envolve avaliar seu custo, seu poder e sua representatividade.

Quantos dias um deputado federal trabalha?

Então se o número de deputados não é um fator determinante de incompetência legislativa, o que é? A pouca produtividade dos nossos políticos é causada por diversos fatores. O primeiro é o baixo número de sessões deliberativas, que é quando os deputados se encontram para votar e analisar alguma coisa. Lembrando que um ano tem 365 dias, e em 2016 tivemos 254 dias úteis, a presença dos parlamentares só foi exigida em plenário em 94 dias, ou seja, 37% do total. Mesmo assim, nossos deputados federais acumularam 5.883 faltas no decorrer de um ano com muita atividade política, já que tivemos o processo de impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff.  Para corrigir isso, os custos de manter os deputados em Brasília, que já é alto, explodiria.  Teríamos que rever toda a estrutura de Estado centralizado que temos.

Esta é a primeira causa. A segunda é o processo interno exigido para aprovar uma nova lei. Embora tenham sido criadas para “pré-julgar” as leis, servindo de filtro para que o plenário só receba matérias relevantes, as comissões acabam servindo como represamentos. Olhem só que interessante este gráfico do site Leis e Números:

Tempo médio de tramitação de lei. Fonte: www.leisenumeros.com.br
Tempo médio de tramitação de lei. Fonte: www.leisenumeros.com.br

Quanto tempo demora para aprovar uma lei?

O tempo médio de tramitação de um Projeto de Lei (PL) apresentado por um deputado federal é de 1.701 dias.

Levando em conta que a presença dos deputados só foi exigida 94 vezes em 2016, podemos perceber que um projeto de lei leva em média 18 anos para tramitar até virar lei. E esta é a terceira causa. O parlamentar que aprova uma lei dificilmente é o autor dela, já que é pouco provável que ele fique 18 anos na câmara dos deputados.  O quarto problema é que, por falta de proximidade entre eleitor e eleito, o deputado não é “punido” eleitoralmente por passar leis ou normas ruins. O que isso significa? Os deputados têm pouco vinculo, já que sua autoria (mérito e cobrança) vão ficar para políticos futuros. Alguns deputados propõe qualquer tipo de lei pa, na eleição seguinte, poder dizer que sugeriu um determinado número de matérias. É retórica de campanha.

O Leis e Números traz outros dados importantes. Criado por Leandro Novais, professor de Direito Econômico da UFMG, os gráficos acima mostram um ponto crítico do nosso legislativo. Se descontarmos as aprovações de leis orçamentárias, tributárias e simbólicas, além da criação de cargos, sobram apenas 26% de leis referentes a outros assuntos. Se removermos também os itens marcados em amarelo, que tem ligação com o cotidiano da máquina pública, restam poucas propostas de fato que tem relevância.

Além de manter o parlamentar refém e incapaz de afetar mudanças, já que é executivo que “libera” o dinheiro das emendas que permitem ao deputado realizar uma obra em seu reduto eleitoral, a presidência também coloca de lado as pautas geradas pelo legislativo e que, na teoria, deveriam vir das ruas, já que um deputado é a voz da população que o elegeu. Olhe o primeiro gráfico. Um projeto de lei proposto pela presidência, chamado de Medida Provisória, leva “apenas” 228 dias para ser aprovado. É exatamente 13,40% do tempo necessário para um deputado aprovar uma lei.

Esse é mais um fator da baixa qualidade da nossa Câmara dos Deputados. Por regulamentação, conveniência e hábito, nossos deputados federais acabam servindo basicamente de aval do que é de interesse do presidente da república. Em função disso o cargo de deputado federal não atrai grandes talentos da sociedade para ocupar esses cargos e elevar o diálogo político.  Acho que isso esclarece uma parte do problema do chamado Presidencialismo de Coalizão (leia-se cooptação)?

Mas o que aconteceria e se déssemos poder efetivo aos deputados e que suas leis passassem com mais rapidez? Num primeiro instante o Brasil certamente quebraria, pois a maioria das leis federais propostas não passam no crivo fiscal ou constitucional. Em um segundo momento os estados membros se rebelariam contra a União, pois os estados não tem poder de recusar essas leis federais que muitas vezes não se encaixam na realidade dos estados. Em outras palavras, o estamento político-burocrático central já entendeu que leis geradas na federação tem de ter muito mais rigor na implementação para não descredenciar o poder central da união totalmente. O que já é o caso por outros fatores.

Em resumo, além de produzir muito pouco, não terem responsabilidade fiscal sobre o que é arrecadado em seus estados, não representarem nada e ninguém, nossos deputados federais ainda custam uma bela fortuna. Embora cada deputado receba “apenas” R$ 33 mil por mês, o poder legislativo, que é toda máquina montada para suportar o trabalho da Câmara dos Deputados e Senado, custa R$ 1,6 milhões a cada hora. Em um país onde há graves problemas de segurança, gastar R$ 1 bilhão por ano com representantes fantoche ineficazes é um absurdo.  Isso sem contar o custo de elegê-los e depois de corrompe-los para obter apoio.

Tiririca disse em sua campanha política, e foi eleito por mais de um milhão de eleitores por isso, que não sabia o que um deputado federal fazia, mas que iria descobrir. Uma planta em um vaso pode receber água todos os dias e ainda morrer de sede, já que a água de torneira não tem nutrientes. E é desta forma que, mesmo com um congresso central ineficaz com 513 deputados federais, nosso país morre aos poucos por falta de boa política. Será que o Tiririca já descobriu isso?

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O Congresso Nacional ainda representa os interesses da população?

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